O Amor que me escapou

Sua despedida fez falta. Não sei se por causa do tempo que carreu mais rápido e avassalador desde sua partida ou se foi só a intensidade da tua ausência que me afetava. Esse silêncio que correu nas minhas veias parecia passar mais tempo em cada batida do coração e ficava preso dentro do meu corpo. Minhas defesas imunes lutavam para derrotá-lo, mas não geravam memória para uma nova batalha. Apenas combatiam diariamente as dores momentâneas.

Engraçado como mesmo assim sofria de um inverno crônico, acompanhado de noite sem fim juntas a um pouco de vinho envelhecido. O que era para ser momentâneo acontecia em frequências tão altas que tornou-se duradouro. Meu sorriso não aparecia, muito menos seguia-te e as lembranças eram ofuscadas, como se perdessem o brilho por não me revigorar. Talvez o objetivo disto tudo fosse mesmo compartilhar o que vivemos, contando as estralas que poderíamos roubar do céu para nos aquecer.

Minhas últimas frases para ti foram: “Voe como um pássaro que conquista o mundo” e “Não fuja nem tenha medo de sua intensidade”. Foi ali então que você molhou minha boca pela última vez e correu para ir embora.

Seu ímpeto foi bom para me manter contigo enquanto pude. Toda essa vivacidade em que nos conhecemos, nos aventuramos e depois nos separamos talvez fosse a resposta para o que eu sempre vivi. Um amor que não podia segurar e acabava escorregando como manteiga na mão. Bastava-me então vivê-lo de forma rápida e singular como você me propôs, o que foi suficiente para deixar marcas.

Novo mundo

Cansado de pensar sobre o que poderia surgir dali pra frente, colocou-se mais uma vez a escrever sobre o seu passado. Pensou em fazer isso rápido, pois como muito tempo havia se passado a maioria das memórias tinham sido esquecidas.

Muito também já tinha sido escrito e o que não fora, pensou que era melhor ficar guardado na cabeça, mas de certa forma parecia que a sensação ainda não tinha passado totalmente. Todos os lugares que visitou, aqueles perfumes, as pessoas que conheceu e as juras de amor que fez incondicionalmente eram quase reais. Tão reais que ele não estava pronto para vivê-las intensamente.

Nada era preto no branco, tudo tinha que ser visto de forma crítica e sem filtros. A vida adulta parecia tão séria que talvez não haja jeito fácil de esquecer a anterior num piscar de olhos simplesmente pela sua existência. Era como se tudo agora passasse em um filme que ocorria ao mesmo tempo de uma playlist e de um show de teatro. Não havia um fio centralizador de ideias. Elas apareciam todas rabiscadas e quando solicitadas vinham com outras complementares. Não havia tempo para apreciação, só para criar e olhar criticamente. Era assim que ele crescia.

Num piscar de olhos viu todos os fios passarem. Havia fios de todas as cores e formas. Corriam sem parar diante da vista já cansada. Já longe de tudo, não faziam mais sentido. Não sabia como fazer. Era como se pela primeira vez na vida estava tentando juntar todas as peças de uma só vez e montá-las, mas não era tão simples assim. Cada rastro deixado por cada história realmente o marcou e vê-las indo embora assim, tão rápido, dava a ele um tantão de anos a mais do que realmente tinha. Queria ouvir estas histórias de novo: As primeiras visitas que teve, as viagens e até as despedidas. Queria viver e aproveitar cada segundo a mais que ganhasse, mas isso era impossível e quando viu que era impossível, desistiu. Apenas olhou pro lado e pro outro e disse que viveria assim mesmo. Desconsertante, como um errante que rasga o céu estrelado, sem rumo, sem destino final. Queria apenas aquela intensidade. Queria também prosperar assim. Não queria mais olhar para o passado apenas com um saudosismo. Contanto que ele ficasse guardado no coração estava bom.

De tudo, quando terminou de raciocinar, pensou que era livre. Como um pássaro que voltou a voar depois de muito tempo, viveu então sem sentir tanto e apreciou cada nova interação. Apenas se deixou levar pelo grande mundo, que agora entende como participante e não dono.

 

O que soprou do leste

A madrugada pode ser fria, o tempo pode ser curto e a separação pode ser mais rápida que os raios solares que te fazem acordar todos os dias de manhã, mas tudo não é em vão quando tentamos alcançar os nossos sonhos.

Vivemos um dia de cada vez, cada momento pode ser o último dia juntos e tudo corre tão rápido que quase não conseguimos ouvir.

O que ouvimos são apenas sons de invernos que nunca vem, verões que foram embora e outonos que foram mas logo voltarão.

O inverno veio, como uma luz, um último resquício do que sobrou da queda e a  queda foi apenas um passo. Pra frente, pra trás não importa. O que importa é que a partir de agora tudo será diferente.

Navio sem Cais

Há quem diga que não há beleza nas terras de cá. Às vezes você se vê realmente sem luz, sem vento e sem chão. Mas tudo é tão belo, tão simples e tão encantador que te da vontade de reviver aqueles fatos novamente.

Você se pega relembrando aquele céu estrelado, regido por inúmeras estrelas e lembra com carinho tudo o que foi feito.

Aí você entende porque o rosa de cada fim de tarde te encanta. Nunca pensei que depois de tanto frio fosse encontrar um pouco de calor naquele belo amanhecer.

Depois as rosas e bem te vis encantaram a mim e a uma amiga, Lisbela. Naquele momento uma imensidão de verde, flores, flores e mais flores. Das mais variadas cores e tipos. Por último os anéis de Saturno. Estes estão tão longe, mas ao mesmo tempo tão perto que quase não consigo imaginar que eles existam.

Talvez agora seja a hora de enfim navegar, sentir a brisa, a água molhando a folha e o sol indo embora mais em mais um fim de tarde. Agora sim, deixe me navegar, pois dos meus pés eu cuido, pés que pisam meu iluminado cais e que me permitem visitar o meu amado Brasil.

Rafael Medeiros

 

 

 

Gelo em chamas

Quando o alerta azul aparece mais uma vez diante aos meus olhos, o ruído indica-me quem é. Olho atentamente e me pergunto se é a neve, interagindo-se na em sua forma mais suave e bela ou é apenas o sol, me chamando mais uma vez para ir embora. Talvez deva esperar mais um pouco. O frio me faz bez também. É como se ele me congelasse… como se parasse o tempo para mim.

Rafael Medeiros

Lua completa

Naquela noite mais fria do outono mais quente, depois da quarta fase, que um dia hei de chegar na quinta fase, mas não tão cedo.

Naquela noite o céu e as estrelas me permitiram olhar para os meus pés da forma mais limpa possível.

O passado me ajudou a chegar no presente, mas o futuro só a lua poderá dizer.

Ela é dona das marés e maremotos. O momento do amanhã é o futuro de ontem, onde tudo foi bizarro.

Todos fugiram, não quiseram ver o novo começo, apenas o amanhecer depois do dia sagrado pelos deuses.

Sair

Com um bilhete carimbado, trevos e amor nas mãos, começava ali um novo início. Era difícil escrever. As mãos tremiam devido ao frio da cidade e pela emoção de lembrar os momentos do último fim. Mesmo assim, se atreveu a tirar o casaco, queria sentir os seus pelos enrijecerem e o calor indo embora. A tinta saiu ferozmente da caneta e a separação tinha sido enfim assinada.

A viagem tinha durado pouco tempo. Os ônibus que saiam da sua cidade corriam rápido e não demorou muito para chegar ao seu destino. Ao chegar lá dias e noites se passaram à espera de um sinal que não veio.Tinham lhe dado a certeza que o dia iria brilhar, que aquele tempo abriria e tudo seria como antes, entretanto, isso jamais aconteceria da mesma forma como tinha sido prometido. Era como se o sol se fechasse e ninguém mais pudesse voar como nos sonhos.

Se aprender a escrever sobre o amor é difícil, entender o fim dele é tão complicado quanto. Pensando de uma forma bem clichê, é como separar duas metades de uma chave, ficando assim cada parte sem nenhuma utilidade. Os passos ficavam pesados devido à chuva e o caminho foi marcado pela insegurança e medo. A felicidade foi realmente de passagem e ao decorrer dos dias tinha cada vez menos vontade de ficar naquele lugar.

Quando enfim foi embora, finalmente estava em contato com a natureza. Abelhas cheiravam as flores da roupa mas não atacavam e mesmo com a chuva os seus cabelos continuavam a brilhar. O tempo, que já não lhe interessava, passava lentamente, os pensamentos passavam como slides de uma apresentação e somente a certeza de que enfim tinha feito a escolha certa. Afinal, se tudo foi sentido de forma racional, todo o resto correu junto com o rio.

 

O corte no círculo

Palavras flutuam na nossa mente. Um emaranhado de sonhos e ideias que não conseguimos captar direito e passamos para o pálido papel antes mesmo de pensar o porquê de fazermos isso. Meio que sem querer, a boca seca larga um ‘sim’ e ciclo começa mais uma vez.

O grafite rasga o véu do silêncio – talvez o único expectador que você tem – e marca o início das turbulências. Nada é mais prazeroso do que sentir o som do movimento das mãos riscando o céu das nossas imaginações. Um sopro voava de longe, vindo marcar os tons e os lugares que pensávamos ser ideais. O nosso cérebro inventa um novo ritmo e cria imagens mais perfeitamente que nossos olhos. Memórias se confundem com os toques e nos deixam arrepiados, como se tivéssemos sido expostos a uma corrente elétrica. O mundo gira mas nada sai do lugar. Tudo funciona numa perfeita sinfonia.

O céu escurece e a tão aguardada chuva realmente vem. Pingando de pouco em pouco, criando poças de pensamentos molhados; mergulhados num murmúrio sem fim, que tentava prevenir as pessoas de males causados pela tempestade e tirar as crianças da rua.

Quando enfim se chega em casa, tira-se o sapato dos pés para sentir o chão gelado e ouvir os passos seguintes da noite de núpcias. Os olhos se abrem, tamanho a ansiedade do momento e a boca cria falsos sussurros de prazer, dizendo que enfim o texto acabou.

Assim como o amor.

Dizer

Dói sentir o vácuo criado pela despedida. Por todo esse tempo eu fugi do teu abraço de adeus e das tuas leves despedidas. Não sabia que isso doeria mais. Não há mais caminho, nem chão. Tanto forjei em nossos pés asas pra voar que agora não há mais volta.

Um gole do amargo faz com que tudo na minha cabeça balance; a luz se desfaz em cores, o sol em átomos e o céu em chuva

A mordida doce faz meu coração parar e rever aquela história de anos atrás. O andar que não existe no prédio, o som que não foi escutado e a onda que banha o chão e desfaz os votos de ano novo que escrevemos na areia. Tudo isso é o que é , o que foi e o que será guardado em lembranças.

Tudo é… tudo é muito. Mas o seu falar sempre foi o necessário, mesmo tímido e com medo e o meu sempre finalista, mesmo confuso. Talvez por isso ninguém soube explicar ou entender.

A pergunta final que fica é como um alarde na consciência:

Will you still remember?

Saudade (felicidade de passagem)

Joguei fora meu texto que tentava explicar o amor. Ele não dizia nada mesmo. Também rasguei aquele plano de vida que havia criado. Se a vida é uma caixinha de surpresas, do que adianta tentar adivinhar o que ela é?

Toda essa tentativa de querer expor tudo que vem à mente é apenas um teste. Caso não fosse, não estaria com a borracha na outra mão. Em um segundo, tudo pode mudar, mas o universo sempre fica. Fica guardado na cabeça, nela cabem mais coisas do que você pensa.

Memórias, é assim que funciona. Do que, eu não sei. Um mapa, cheio delas, com altos e baixo, com breves flashes do que foi e do que é alegre e também com o que é inóspito para nós.

Às vezes, a ponta fina e afiada também aparece. Pra transformar aquela infinidade de ligamentos em um único círculo ou em retas paralelas. Para correr e esquecer-se de tudo.

E eles vão correndo, até que…

Até que uma hora alguém ganha outros ventos para os pulmões, consegue distância e fôlego. Descansa com o cheiro das flores misturado com o que sai da pele, já molhada de suor.

Depois disso começa a chuva. A tempestade despeja a saudade e esta diz que vai embora. Vai porque se importa. Importa-se e é importante para que a tristeza não entre em cena e comece a contar a história dela.

Ela diz que é essencial ser assim, porque se não tudo cansa, porque caso não seja dessa forma tudo cansa e nada mais vale a pena. Por isso ela vai embora, ou melhor, dá umas voltas por aí.

Felicidade de passagem, saudade da história.

(Rafael Medeiros)